24 de julho de 2009

Sushi - Marian Keyes [2]

Depois que Lisa deixou Ashling e Clodagh na portaria, obrigou-se a voltar a pé para casa. Era algo que passara a fazer regularmente, para contrabalançar todos os jantares que Kathy a obrigava a comer. Enquanto caminhava, obrigou-se a manter a tristeza a distância. Sou fabulosa. Tenho pais fabulosos. Tenho um novo emprego fabuloso como consultora de mídia. Tenho sapatos fabulosos.
Quando dobrou a esquina de sua rua, viu que alguém da vizinhança se sentava no degrau da porta, à sua espera. O que a surpreendia era que não pegassem as chaves com Kathy e entrassem sem a menor cerimônia, pensou, irônica.
Sentiria falta de todos eles quando voltasse para Londres. Embora Francine vivesse lhe dizendo que não era o caso, pois Lisa receberia tantas visitas, que seria quase como se não tivesse chegado a ir embora.
Mas, afinal, quem estava no seu degrau? Francine? Beck? Mas a pessoa era do sexo errado para ser Francine, alta demais para ser Beck, e... Lisa sustou o passo, ao perceber que era da cor errada para ser qualquer um dos dois. Era Oliver.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou, atônita.
— Vim ver você — respondeu ele.
Ela alcançou a porta e ele se levantou com um largo sorriso branco.
— Vim reconquistar você, paixão.
— Por quê? — Ela enfiou a chave na fechadura e ele entrou atrás dela no vestíbulo. Sentia-se confusa — e estranhamente ressentida. Passara o dia inteiro se esforçando para “tocar a bola para a frente”, e ele lhe dera uma rasteira.
— Porque você é a melhor — disse ele, com toda a simplicidade. E outro sorriso ofuscante.
Ela atirou as chaves na mesa da cozinha.
— Pois chegou um pouquinho atrasado — tornou ela, irritada. — Nós acabamos de nos divorciar.
— Sabe — disse ele, pensativo —, eu me sinto uma merda com esse divórcio. Deu um nó na minha cabeça que você não faz uma idéia! Mas, enfim, não há nada que impeça a gente de se casar de novo — disse, sorrindo. E, quando ela lhe deu um olhar cuja legenda era “Seu filho-da-mãe maluco”, ele insistiu: — Estou falando sério!
Ela lhe lançou outro olhar da mesma família do primeiro, mas, de repente, seus pensamentos ficaram um pouco irrequietos e difíceis de dominar. A idéia de se casar com Oliver de novo era ridícula, mas tentadora. Extremamente tentadora — durante mais ou menos um nanossegundo. Em seguida, ela caiu na real.
E perguntou, brusca:
— Não se lembra de como era horrível? No fim, a gente discutia o tempo todo, era um inferno. Você tinha ódio de mim e do meu emprego.
— Tem razão — admitiu ele. — Mas, em parte, a culpa foi minha. Quando você desistiu de ter um bebê, eu devia ter te dado atenção. Sei que você tentou me contar, paixão, mas eu não queria saber. Foi por isso que fiquei louco da vida quando descobri que você ainda estava tomando a pílula. Mas, se tivesse te dado atenção... Enfim... E você está tão diferente, não é mais tão dura quanto era. Sinto muito, paixão — disse ele, ao ver que ela se encrespara —, mas é a verdade.
— E isso é bom?
— Claro.
Diante de sua expressão cética, ele disse, com brandura:
— Lisa, nós estamos separados há mais de um ano, e a barra ainda não aliviou para mim. Não conheci ninguém que chegasse aos seus pés.
Sua expressão era ansiosa, como que à espera do encorajamento ou aquiescência dela, mas ela não lhe deu nenhum dos dois. Toda a despreocupação que ele sentia ao chegar se esvaíra, e estava subitamente ansioso.
— A menos que você tenha conhecido alguém. Se for o caso, eu tiro meu time de campo — disse, gentil. — E desisto de tentar reconquistar você.
Com uma fisionomia inescrutável, Lisa o encarava, considerando a hipótese de lhe dar um sorrisinho maroto, do tipo talvez-sim-talvez-não. Isso daria um basta naquela situação absurda, perigosa. Do nada, porém, mudou de idéia. Jamais jogara com Oliver, por que haveria de começar agora?
— Não, Oliver, não conheci ninguém.
— Tudo bem — ele assentiu lenta e cautelosamente. — Bom, já posso parar de me roer por dentro. — Após uma pausa nervosa, continuou: — Ainda te amo. Agora que estamos mais velhos e mais maduros — deu um risinho inseguro —, acho que tem tudo para dar certo.
— Acha? — A pergunta foi feita com toda a calma.
— Acho — afirmou ele, categórico. — E, se você estiver interessada, posso me mudar para Dublin.
— Não seria necessário, vou voltar para Londres no fim da semana — murmurou ela.
— Então, Lisa — disse Oliver, com uma expressão extremamente séria —, só resta saber se você está interessada.
Seguiu-se um longo e tenso silêncio. Por fim, Lisa disse:
— Acho que sim. — De repente, sentia-se encabulada.
— Tem certeza?
— Tenho. — Deixou escapar um risinho nervoso.
— Paixão! — exclamou ele, fingindo-se indignado: — Se é assim, por que é que você está me torturando desse jeito?!
Ainda encabulada, ela confessou:
— Eu estava com medo. Eu estou com medo.
— De quê?
— De ter esperança, acho — disse ela, dando de ombros. — Não queria ter nenhuma, porque havia a hipótese de você estar agindo por impulso. Eu tinha que ter certeza da sua certeza antes mesmo de poder pensar no assunto. Porque — confessou, tímida — eu te amo.
— Então não precisa ter medo — prometeu ele.
— Quando foi que você ficou tão ajuizado? — resmungou ela.
Ele soltou uma gargalhada forte e alta, uma gargalhada tipicamente sua, e, de repente, os pensamentos de Lisa simplesmente dispararam, como cães soltos de suas coleiras.
Quanta sorte ela tinha de ganhar outra chance? A extensão integral de sua suprema boa fortuna revelou-se para ela, e ela se sentia no sétimo céu, quase imponderável de felicidade. Nem todo mundo tem uma chance dessas, compreendeu, degustando, pela primeira vez na vida, o valor do momento presente.
Vou fazer tudo diferente dessa vez, jurou de pés juntos. Os dois fariam. E, mais uma coisa, o fecho de ouro, por assim dizer: se dois casamentos entre as mesmas pessoas eram bons o bastante para Burton e Taylor, então também eram bons o bastante para ela. Incapaz de frear sua cabeça eufórica, já planejava um segundo casamento, um festival de plumas e paetês, pompa e circunstância. Nada de fugir para Las Vegas dessa vez — não, fariam tudo como mandava o figurino. Sua mãe ficaria deslumbrada. E eles chamariam a revista Hello! para fotografar a cerimônia...
Como se pudesse ler os pensamentos de Lisa, Oliver exclamou, ansioso:
— Calma, tigresa!

Retirado do livro Sushi de Marian Keyes, capítulo 65.
Ps: Só conto histórias com finais felizes. Diga-se de passagem, que final feliz... Recomendo muito o livro. Mesmo.

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