1 de abril de 2011

Fios de esperança.

Primeiro vai tocar nossa música, você sabe, aquela que marcou pra gente e que nunca perdeu o sentido. Vai começar a tocar ela e eu já vou saber que é você porque só pode ser você, essa música só vai tocar se você ligar. E quando ela tocar virá o desespero, não aquele ruim - cheio de vontade de fugir e chorar -, mas aquele desespero bom de não saber o que fazer num momento mágico porque faltarão mãos e pés para alcançar o telefone e haverá uma curiosidade e, ao mesmo tempo, um receio do que pode vir, sabe-se lá como, junto da tua voz vinda daquele aparelho.
E eu vou ouvir você perguntar quem fala e, mesmo não sendo necessário, vou dizer que sou eu e perguntar quem é que tá falando, como se fosse possível esquecer tua voz, como se eu não tivesse teu número salvo ou nossa música tocando quando você decidisse ligar, como se à essa altura eu não me sentisse flutuar por reconhecer o jeito mágico que só você tem de chamar pelo meu nome. Eu nem vou acreditar, foram várias noites sabe? Foram vários fins-de-tarde vendo o sol sumir e vários mais começos-de-dia vendo o sol nascer. As vezes chovia, nessas era ainda mais terrível a espera. Noutras vezes não haviam estrelas durante a noite, várias nuvens cinzas, toda essa coisa triste das noites e dias que demoram demais pra passar. Era horrível, um vazio sem tamanho e eu lá, esperando a música começar a tocar, qualquer coisa pra ouvir a música outra vez saindo daquele aparelhinho que não parece caber nada, mas guarda todas as minhas esperanças.
E então a música vai tocar, porque tá escrito que vai acontecer e eu sei disso bem no fundo e nada que vem bem de dentro se engana, não pode se enganar. E quando reconhecermos nossas vozes, quando notarmos o conforto de reconhecer nossos sons, esses barulhos e ruídos que só nós entendemos, então eu vou falar. Eu vou falar da saudade, dos lugares, das esperanças, dos sonhos. Eu vou falar tanta coisa, tanta coisa, mas tanta... Eu vou falar do tempo que parece nem ter passado e das chuvas que molharam tudo lá fora, eu vou falar de todo o amor que eu continuo sentindo e de como nada de nós mudou...
Talvez eu não fale nada, quer dizer, talvez não saia nem uma palavra concreta ou só as respostas pras suas perguntas, mas você sabe que o silêncio também fala, não é? Você sabe que mesmo que eu não diga nada, mesmo que as palavras não saiam, vou estar dizendo tudo, contando do mais íntimo ao mais superficial, quase que cantando cada um de todos os detalhes que é essa solidão que ficou depois que você se foi...
Primeiro a nossa música, depois o reconhecimento das vozes, depois vem todo o resto. E depois do resto vem o adeus. Nenhum encontro às escondidas, nenhuma grande declaração. Mas você vai dizer que está bem e eu vou dizer isso também. E de alguma forma, mesmo que da minha parte não seja verdade, vai ser suficiente ouvir isso e depois, adeus.
E o aparelhinho volta pra cabeceira da cama e eu lá, olhando pra ele outra vez, tanta coisa pra falar e nenhuma coragem de dizer... E virão as noites, dia pós dia e a fé vai continuar a mesma ou, quem sabe, até cresça... E eu esperando nossa música voltar a tocar.

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