Não bastassem as noites mal dormidas, agora tinha pra somar também os dias de calor profundo que passam vagamente e rancam suor, lágrima e, pra não dizer que tudo está perdido, algumas calorias.
Antes, quando o fim parecia temporário e a fé continuava inabalável, os dias não doíam tanto e, não fossem as noites em que a cama de tão gigante te devora, continuaria certa de uma volta. Mas não volta, não vem. Tem todas as lembranças num canto da alma e tem todo o medo de não conseguir superar.
Então a gente foge. Foge porque num primeiro momento a fuga é o melhor remédio. E se esconde das músicas, lembranças e de tudo o mais que volte a fazer do passado ferida presente. Vai buscando abrigo numa voz diferente, num beijo que não toca mas engana, num abraço que não sacia mas conforta. É isso, a gente foge por querer conforto.
E em conversas como essa, quando as verdades são ditas sem perceber, é impossível não falar do amanhã que nunca chega e do ontem que nunca passa. A gente fica aqui, parado no tempo, enquanto a vida segue e a gente não sabe se vai conseguir. Não sabe por saber do quanto a falta ainda machuca e de como fica cada dia mais difícil ouvir aquela música que não tem tua voz, mas diz exatamente o que você não tem forças pra dizer.
Vai levando essa angústia triste, vai seguindo um caminho longo, até encontrar um consolo numa companhia que nem sempre agrada, mas ao menos ilude. Aliás, em casos como esse, uma ilusão é sempre bem-vinda. E de ilusão em ilusão se percorre esse caminho sinuoso, que vai dar não se sabe onde e que, bar sim bar não, te faz soltar vez ou outra uma verdade. Verdade que não deveria, mas ao ser dita, alivia!
E vai fingindo que não se importa, porque é assim que deveria ser, mas tanto leva em conta que não sabe como esquecer e ao tentar fingir que não, só consegue deixar transparecer. As aparências não enganam. Não nesse caso. Caso que nem deveria ser contado, mas pra um alívio imediato vai virando palavras e sendo espalhado, entre copos de vidro sempre meio-cheios e textos nunca lidos. Porque pegar o telefone e falar a quem se deve é insuportável. Porque bater na porta de quem realmente interessa parece impossível. E com esse orgulho desmedido e esse medo da verdade vai levando, vivendo recomeços de mentirinha e sorrindo pra que ninguém descubra essa falsa felicidade.
Só não esqueça de esconder os olhos, ainda que não queiram, eles tendem a falar. E não mentem!